Por Caroline Marcon e Paul O'Doherty da Field Top Teams Consulting
“Nós somos afetados não pelo que acontece conosco, mas pelo nosso pensamento em relação ao que acontece conosco”. Epicteto
O início de 2020 foi marcado por uma tempestade global de proporções intensas. Muitas organizações que já sofriam para se adaptar ao cenário de disrupção tecnológica e incerteza econômica viram suas receitas despencarem mais ainda devido aos efeitos da pandemia do Coronavírus. A curva da mudança está tão acentuada que de fato desafia a capacidade humana de adaptação.
Há bastante clareza sobre o que precisa mudar. Várias pesquisas apontam que já existe um consenso se formando com relação ao que será necessário no ambiente de trabalho pós-pandemia. Caem a burocracia, a hierarquia, os silos e o foco em comando e controle. Sobem o propósito, o foco no cliente, a agilidade, a colaboração, a simplicidade, a empatia e o cuidado com as pessoas – só para mencionar os mais citados.
‘Com tanta clareza sobre o que é necessário’, você deve se perguntar, ‘por que as organizações têm tanta dificuldade em mudar?’ Por que as mudanças são tão confusas e lentas?’ Se você sente algo assim, você não está sozinho.
O pesquisador britânico Richard Barrett costuma dizer que “Organizações não mudam – pessoas sim.” A única maneira de mudar a cultura de uma organização é mudando os comportamentos de seus líderes: ao mesmo tempo e na mesma direção. Se você quer que o seu negócio seja mais ágil e inovador, você precisa criar condições para que as pessoas aprendam a tomar decisões mais rápidas e que os times tenham capacidade e autoridade para gerar novas soluções e pilotá-las. Mas apesar da clareza de direção, muitas empresas estão sofrendo para lidar com a resistência à mudança.
Diante de tantas abordagens de transformação pessoal disponíveis - “The Work” (O Trabalho) – método criado pela norte-americana Byron Katie talvez seja o mais simples e efetivo. Katie tem 77 anos e demonstra um bom humor e uma vivacidade física e mental impressionantes. Ela conduz processos de imersão no seu método em várias partes do mundo e particularmente na Califórnia. A experiência para muitos participantes é um divisor de águas. É difícil de acreditar que algo tão simples - que só requer vontade, papel e caneta - possa gerar tamanha transformação na compreensão da realidade e nos livrar de tantos fardos emocionais. Katie não usa dogmas, nem ‘truques’, nem jargões psicológicos, nem gera dependência de longas séries de cursos ou terapias. Ela também ensina em presídios, em salas de Board de empresas da Fortune 500 e em comunidades de rua com igual empatia e impacto.
Katie prega liberdade imediata e radical. Ela ensina a pensar com clareza, a ir direto na raiz dos problemas. Para isso, ela usa quatro perguntas simples com precisão cirúrgica. As perguntas nos ajudam a estruturar e a examinar o nosso pensamento com objetividade. Quando experimentamos sensações de estresse ou de dor, desde as mais leves até raiva intensa ou desespero, as perguntas de Katie permitem isolar o pensamento inicial que desencadeou as reações emocionais, sejam elas conscientes ou não. Para acabar com o estresse é preciso identificar a crença limitante que está por trás do pensamento, trazê-la à luz para entender suas causas e efeitos. Assim, podemos refletir se queremos continuar com ela ou não. Na maioria dos casos, a simples percepção do sofrimento gerados por uma crença limitante esvazia o poder que ela tinha sobre nós. O problema desaparece.
A abordagem das quatro questões que Katie elaborou tem semelhanças com a filosofia Zen e com o diálogo socrático, com a vantagem de ser mais prática. Ela possibilita uma autodescoberta contínua. De acordo com Katie, “É mais que uma técnica para resolver problemas. Ele traz à tona um aspecto profundo e inato do nosso ser”.
É certo que quando nós brigamos com a realidade, nós perdemos. Cem por cento das vezes. Por outro lado, ninguém é capaz de ‘controlar’ os próprios pensamentos. O que fazer então? Uma das respostas ensinadas pela meditação é que devemos ‘deixar passar’ os nossos pensamentos, sem apego. Observar e deixar passar. O que Katie propõe é diferente. Ela propõe analisar ativamente e com objetividade os nossos pensamentos para gerar clareza. Assim, conseguimos desativá-los e eles nos deixam em paz.
O que é uma crença? É um pensamento cristalizado há tempos, que ganhou status de verdade e passou ‘batido’ pelo radar da autorreflexão. Quando nos habituamos a viver com crenças irrefletidas, vivemos um ‘sonho’ fora da realidade, que por vezes mais se parece com um pesadelo. A autorreflexão permite trazer à tona essas crenças negativas para nos livrar delas e experimentar a paz, mesmo quando percebemos que o mundo lá fora está um caos. Por meio das quatro perguntas nos damos conta de que as respostas das quais precisamos só estão disponíveis em nós mesmos.
E por que este método ainda não foi divulgado e aplicado massivamente, dado que só traz benefícios? Porque ele é simples, mas não e fácil. Os mesmos hábitos que mais nos ajudam a crescer – feedback e autorreflexão – também podem ser constrangedores e difíceis de lidar. Se nós nos enxergamos como pessoas muito talentosas, profissionais bem-sucedidos, uma voz interior pode enviar sussurros de conforto, tais como “você é ótimo”; “continue do jeito como sempre fez”.
Para que o método de Katie comece a mostrar seus efeitos, é preciso em primeiro lugar que tenhamos uma boa dose de abertura e humildade para entrar em áreas pouco exploradas da nossa mente – áreas protegidas pelo ego.
Um ego saudável é essencial para o nosso desenvolvimento. Ele nos dá sensação de segurança, de amor próprio e de estarmos no controle das situações. Assim, ele nos afasta dos medos, nos revela os padrões de comportamento que funcionam para sermos aceitos e valorizados pelos outros. Um ego imaturo, por outro lado, pode distorcer nosso senso de realidade – fazendo com que nos percebamos muito acima ou muito abaixo dos outros. Ele pode provocar comportamentos egoístas, controladores e arrogantes - ou no outro extremo - excesso de carência e busca constante por validação e atenção.
O problema é que em situações de crise nós ficamos sobrecarregados pelo estresse e ansiedade, o que ativa ainda mais o lado negativo do ego. Quanto mais desafios de negócio enfrentamos, quanto mais incerteza no ambiente, mais estresse e menos espaço mental para autorreflexão.
Como transpor nossas defesas naturais contra a mudança e transformar nossos comportamentos, para que a organização consiga se adaptar?
As quatro perguntas dão voz aos nossos julgamentos, para que saiam da nossa mente para o papel, sem censura. Assim poderemos processá-los com entendimento e aceitação. Quando perdemos o medo de destrinchar os nossos pensamentos estressantes no papel, o ego se libera e entrega tudo o que queremos saber.
Afinal, quais são as quatro perguntas poderosas? Mais do que ler, convidamos você a reservar um tempo para praticar o exercício. Primeiro, escolha um pensamento que lhe gere estresse ou sofrimento. Você só precisa de papel, caneta e humildade. Por exemplo: “eu não sou bom o suficiente”.
1. Isto é verdade? (Sim ou não). Esta simples resposta pode mudar sua forma de ver a vida. Deixe a sua mente fazer a pergunta e espere pela resposta genuína que irá surgir junto com a lembrança da situação na sua mente.
2. Você pode ter certeza de que isto é verdade? (Sim ou não). Esta é mais uma oportunidade de abrir a sua mente e ir além do pensamento padrão.
3. Como você reage, o que acontece quando você acredita neste pensamento? (Sensações físicas, memórias do passado, ações etc.). Aqui começamos a entender a causa e efeito do pensamento. Como você se comporta e como se sente quando acredita no pensamento? Como você trata as outras pessoas? Continue a escrever no papel à medida em que você revive a situação na sua mente e observe como você reage quando acredita no pensamento. Este pensamento traz estresse ou paz para a sua vida? Que imagens você vê, do passado ou futuro, e que sensações físicas você experimenta? Como você trata a si mesmo nesta situação?
4. Quem você seria sem este pensamento? Esta pergunta é muito poderosa. Imagine você na presença da pessoa que lhe causou o estresse/ sofrimento, fazendo o que você considera que ela não deveria estar fazendo. A diferença é que agora você não terá mais o pensamento anterior para ancorá-lo. Quem você seria, na mesma situação, se você não acreditasse naquele pensamento? Tome seu tempo para sentir.
Por fim, inverta o pensamento. Transforme em algo que represente a ‘sua verdade’ e remova o sofrimento ou estresse. Para cada inversão que você pensar, procure pelo menos três exemplos que possam ser verdadeiros para você na situação específica. Uma inversão possível para o exemplo que demos aqui poderia ser “Eu sou bom o suficiente”. Ou “Eu sou mais que suficiente".
As inversões de pensamento são a sua receita para saúde mental e paz interior.
Os benefícios das quatro questões se completam quando de fato começamos a viver as inversões de pensamento e a transformar o ambiente ao nosso redor. Quando nos damos conta dos julgamentos que fizemos, das nossas reações a esses julgamentos e de como eles podem ter impactado outras pessoas. Ao atingimos este nível de humildade, nos tornamos mais conscientes e livres.
Para saber mais sobre o método The Work, acesse: https://thework.com/sites/portugues/
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